Poderia pedir que você ficasse
Mas não poderia; cada dia mais esqueço.
Nunca vi seu rosto por inteiro
Você, com tantos mistérios,
Desaparece na neblina
Daquela mesma atmosfera trovejante
De janeiro.
Do nosso primeiro abraço.
Não penso em você como um engano
Apenas como um amante
Mais ainda dos mesmos
Galanteios, gestos
Perfumes e dizeres
Reles
Que não deram certo.
Não quero que me explique-prefiro o olvido
De você, espero apenas um adeus covarde
Desses de duas palavras
Ao telefone.
E não se envergonhe
Por isso
Há muito já não exijo
Provas de uma lealdade
Tão proclamada
E tão falsa.
Você, nem tema ser esquecido
(ou odiado)
Serei cínica ao negar
O que eu sentia
Por mais que você indague.
Cuidadoso você irá procurar
Provas de minhas faltas
E me crucificará por meus pecados
Sim, sei que você me culpa.
Também espero que me acuse
De todos os seus defeitos
Que não amei.
Realmente não pude
Nem mais lamentar:
Desconheço minha culpa
Já não tenho memória
Que ainda me dê
Satisfação para lhe amar.
sábado, 29 de março de 2008
quinta-feira, 6 de março de 2008
Meus indicadores e médios volteiam na veludosa superfície. Querem lhe extrair o viço, remover o castanho que tanto custou ao sol tingir deteriorando-o em um amarelo pálido e tedioso.
Desmonto. Desfaço as estruturas finas imaginando ser o mais árduo obstáculo. Como minha vida. Em relação a esta, nada. A não ser atribuir meus movimentos neuróticos e mínimos a investidas reais de coragem delirada. Tudo ensaiado numa poltrona no meio dos livros e do mofo, onde ninguém me ouve. Onde ninguém precisa me ouvir. Então aferro meus dedos aos fios e ensaio acrobacias de destreza formidável que terminam em górdios embaraços. Tudo culpa do nervosismo.
Percorrendo as espirais, desfaço mentalmente aqueles metafóricos e mais difíceis nós indiferentes à minha fúria.
Marcas sobrepõem-se em meus dedos, vermelhos: até eles estão irritados com este ritual compulsivo. Mas minha loucura transferiu-se a eles. Pequenos e incansáveis maníacos.
Provo da coisa que é um amontoado de fagulhas com seu cheiro de queimado. Tem o gosto do sangue que ao correr por minhas veias, convulsiona meu corpo. Ainda faísca.
Pelo menos o que quer queimar em mim, transfiro para estas cinzas descoradas que impregnam tudo da minha agonia.
Desmonto. Desfaço as estruturas finas imaginando ser o mais árduo obstáculo. Como minha vida. Em relação a esta, nada. A não ser atribuir meus movimentos neuróticos e mínimos a investidas reais de coragem delirada. Tudo ensaiado numa poltrona no meio dos livros e do mofo, onde ninguém me ouve. Onde ninguém precisa me ouvir. Então aferro meus dedos aos fios e ensaio acrobacias de destreza formidável que terminam em górdios embaraços. Tudo culpa do nervosismo.
Percorrendo as espirais, desfaço mentalmente aqueles metafóricos e mais difíceis nós indiferentes à minha fúria.
Marcas sobrepõem-se em meus dedos, vermelhos: até eles estão irritados com este ritual compulsivo. Mas minha loucura transferiu-se a eles. Pequenos e incansáveis maníacos.
Provo da coisa que é um amontoado de fagulhas com seu cheiro de queimado. Tem o gosto do sangue que ao correr por minhas veias, convulsiona meu corpo. Ainda faísca.
Pelo menos o que quer queimar em mim, transfiro para estas cinzas descoradas que impregnam tudo da minha agonia.
sábado, 1 de março de 2008
O homem conhecia a mulher senão pelo toque.
Quando se aproximava, toda ela se eriçava em acúleos de roseiras e flores de amoreira brotavam de seus poros. O perfume atraía os beijos que se colavam nos espaços em que havia a pele sanguínea, parecendo diamantada.
Por alvoroço ou descuido, um dia, o homem cegou-se nos espinhos. Não via nada além de uma escuridão de sono e carente de vida. Ele, agora, investia contra as puas querendo purificar-se fazendo de sua tez, antes macia, carne viva e cicatrizes. Na ausência dela, chorava absinto e tudo se impregnava de vapores lodosos.
Conhecia a mulher senão pelo toque. E ela sequer suspeitava do desespero das trevas do homem. Seu afago, como antes, era suave e exato e justamente nas lacunas em que não havia brotos, somente pele tecida pelos insetos servos de suas folhas. Ele não sabia deste tecido acomodado tão bem em meio aos espinhos.
Então a mulher precisou que o homem visse: indagou-o pelo céu, e ele não pôde dizê-lo. O céu em questão tinha arco-íris e chuva fina rendando o sol. Assim, com a mesma aflição do homem esta lhe lambeu os olhos com sua saliva de açúcar. E aos tragos, sorveu todo o fel que enegrecia sua vista.
Aos poucos, ele voltava a ver. Bem queria avistar aquele sol prometido de novo e relatá-lo à mulher, mesmo que tão já sabido e estigmatizado; mas agora só chovia. Abafada, rala e cinzenta era a chuva. Esboços daqueles dias passaram pela visão ainda turva. Com beijos agradeceu à mulher a cura, mas os beijos de açúcar dela agora eram de um amargor terrível. E de novo buscando algo como santidade, os queria cada vez mais ávido, como se pagasse o preço de sua cura que não se pagava porque era amor.
Pelo menos a exuberância do jardim era a mesma, ele pensava. Mas tudo era outro. As mariposas que saíam naquele momento do casulo ouviram estes pensamentos e os contaram a mulher.
Amanheceu e o homem via tudo limpo, enxergando até melhor que antes. Olhou ao redor procurando a mulher e a encontrou desnuda de seus ramos de rosas com acúleos e folhas repletas de insetos e sem sua pele de seda brilhante; comum e pálida, com medo do que deixara de ser.
Conhecia a mulher senão pelo toque.
Nunca mais foi visto o homem que correu de susto do que havia violado.
A mulher até hoje chora alcatrão estranhamente colorido daquele arco-íris, que nunca mais apareceu. Sua saliva agora é ambrosia e a pele viceja e brilha tanto que cega qualquer um que se aproxime-menos aquele que conhece além das puas.
Quando se aproximava, toda ela se eriçava em acúleos de roseiras e flores de amoreira brotavam de seus poros. O perfume atraía os beijos que se colavam nos espaços em que havia a pele sanguínea, parecendo diamantada.
Por alvoroço ou descuido, um dia, o homem cegou-se nos espinhos. Não via nada além de uma escuridão de sono e carente de vida. Ele, agora, investia contra as puas querendo purificar-se fazendo de sua tez, antes macia, carne viva e cicatrizes. Na ausência dela, chorava absinto e tudo se impregnava de vapores lodosos.
Conhecia a mulher senão pelo toque. E ela sequer suspeitava do desespero das trevas do homem. Seu afago, como antes, era suave e exato e justamente nas lacunas em que não havia brotos, somente pele tecida pelos insetos servos de suas folhas. Ele não sabia deste tecido acomodado tão bem em meio aos espinhos.
Então a mulher precisou que o homem visse: indagou-o pelo céu, e ele não pôde dizê-lo. O céu em questão tinha arco-íris e chuva fina rendando o sol. Assim, com a mesma aflição do homem esta lhe lambeu os olhos com sua saliva de açúcar. E aos tragos, sorveu todo o fel que enegrecia sua vista.
Aos poucos, ele voltava a ver. Bem queria avistar aquele sol prometido de novo e relatá-lo à mulher, mesmo que tão já sabido e estigmatizado; mas agora só chovia. Abafada, rala e cinzenta era a chuva. Esboços daqueles dias passaram pela visão ainda turva. Com beijos agradeceu à mulher a cura, mas os beijos de açúcar dela agora eram de um amargor terrível. E de novo buscando algo como santidade, os queria cada vez mais ávido, como se pagasse o preço de sua cura que não se pagava porque era amor.
Pelo menos a exuberância do jardim era a mesma, ele pensava. Mas tudo era outro. As mariposas que saíam naquele momento do casulo ouviram estes pensamentos e os contaram a mulher.
Amanheceu e o homem via tudo limpo, enxergando até melhor que antes. Olhou ao redor procurando a mulher e a encontrou desnuda de seus ramos de rosas com acúleos e folhas repletas de insetos e sem sua pele de seda brilhante; comum e pálida, com medo do que deixara de ser.
Conhecia a mulher senão pelo toque.
Nunca mais foi visto o homem que correu de susto do que havia violado.
A mulher até hoje chora alcatrão estranhamente colorido daquele arco-íris, que nunca mais apareceu. Sua saliva agora é ambrosia e a pele viceja e brilha tanto que cega qualquer um que se aproxime-menos aquele que conhece além das puas.
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